Artigos
Artigos anteriores

Ondas e Refluxos
por Petrucio Chalegre, Diretor-Presidente

"As sociedades comportam-se com movimentos ondulatórios. Após a queda da monarquia na França de 1789 seria difícil supor um império como o Napoleônico. Mas este foi muito menos aristocrático que o reinado dos Bourbons. Em nosso século a revolução russa desembocou num desenfreado centralismo decisório, até quantos preservativos seriam usados em Kiev era uma decisão de Moscou. A ascensão do poder sindical atingiu paroxismos na Inglaterra, houve um momento em que, soterrados pelas vantagens obtidas, os serviços gráficos ficaram tão caros que mais valia a pena imprimir em Nova York e trazer os impressos de avião, que executar os serviços gráficos em Londres.

Em todos estes casos o refluxo veio inevitavelmente. Porém este rebaixamento da crista da onda, que se opôs ao exagero anterior, assim como sucede na beira mar, foi de exagero oposto. Na França guilhotinaram-se os aristocratas. Na URSS o centralismo ditatorial foi sucedido pela quase anarquia, um vazio do poder central que esfacelou o império. E na Inglaterra o Thatcherismo inaugurou a era neoliberal demolindo o poder sindical e recolocando o país no caminho da competitividade. O refluxo? Basta olhar para Tony Blair, ele representa um retorno a preocupações distributivas e sociais mas sem abrir mão dos frutos, economicamente excelentes para os britânicos, do saneamento promovido pela dama de ferro.

O fato é que, como em qualquer maremoto, as ondas que se sucedem a primeira são progressivamente mais moderadas. O mar procura um equilíbrio e a sociedade também, diminuindo a cada evento tanto a crista máxima como o refluxo conseqüente. O mundo hoje já viu quebrar-se o impulso do neoliberalismo que veio opor-se ao desenfreado crescimento de vantagens acumulados pelo movimento libertário de populações outrora oprimidas. O Brasil não é exceção, mas para variar vem a reboque dos acontecimentos no resto do mundo. Um certo isolamento cultural faz com que tenhamos aqui gente a defender idéias já sepultas e malcheirosas no resto do planeta.

Nosso próprio presidente representa com perfeição este movimento pendular decrescente. Suas idéias vem sofrendo modificações através dos anos, muito bom isto, bem melhor do que o imobilismo intelectual de muitos de nossos líderes políticos cuja última evolução intelectual ocorreu nos anos 50. Em um mundo turbulento a incapacidade de adaptação transformou, homens populares no passado, em dinossauros que as urnas reduziram a sombras do passado em termos de aprovação eleitoral.

O ambiente de vantagens sempre crescentes atingiu um limite no país, levando o estado a uma quebra virtual, da qual o melhor exemplo é uma previdência que leva mais de metade dos recursos da União. É inevitável o refluxo dentro do sistema. A atual crise de confiança mundial nas finanças do país é causada por este déficit contábil. A esquerda brasileira não percebeu o ir e vir das ondas, mas os eleitores o percebem, se não em suas mentes, em suas vísceras. Os instintos que levam o país a optar pela segurança e sensatez são a raiz da vitória esmagadora de um presidente, que promete sacrifícios antes das eleições em vez de um paraíso no qual o povo desacredita."

Voltar