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A mente aprisionada
por Petrucio Chalegre, Diretor-Presidente

"Época de férias. Profissionais cansados atiram-se às praias, às serras e tentam livrar-se da ansiedade. Sonham sentir-se livres, repousados, mudando de ambiente, fazendo outras coisas. Mas para muitos deles o que sonham não se realiza. Flores, campos, oceano, nada mais parecem que telas aonde se projetam sem cessar as mesmas preocupações de sempre. Seu mundo os acompanha como uma tatuagem irremovível, manifestando-se sob a forma de pensamentos recorrentes.

O motivo pelo qual um homem se sente com sua mente aprisionada, no modo habitual, é a fixação de um hábito. Seu cérebro não pode escapar dos pensamentos que sempre o ocuparam porque nada existe para ser colocado em seu lugar. Seria preciso uma coisa mais poderosa, um pensamento mais forte. Na tentativa de usar esta primeira e mais primitiva opção, muitos afogam-se em diversões sem fim. Jogam cartas, por exemplo, o resultado é a transferência das tensões normais apenas para outra atividade. Permanece o indivíduo ainda tentando ganhar, receando perder, e eventualmente entrando em conflito com seus parceiros. Trata-se da mesma mente do trabalho, apenas transmudada, transferida para a mesa de carteado, para uma pelada de praia onde irritações surgem, brigas espoucam.

O mesmo sucede quanto a mera torcida por um time ou coisa similar. Assumimos como nossa a abstração de uma bandeira, uma cor, sofremos e torcemos por uma criação mental alimentada dentro da consciência como uma paixão por um ídolo cinematográfico. Chamamos a isto "distrair-se", talvez fosse melhor dizer "se trair", visto que continuam havendo tensões e competições como em qualquer trabalho.

Alguns retornam de férias desejando tirar férias para descansar das férias. O verdadeiro descanso seria ser capaz de estar em férias reais com uma mente não competitiva, voltada para uma contemplação da vida por si mesma. Fazendo coisas inteiramente diversas das do mundo das lutas, como caminhar sem rumo, meditar silenciosamente, "além do pensar e não pensar", como um monge zen budista, ler literatura pura ou poesia.

No caso de uma mente realmente avançada em seu treinamento é possível transformar todos os movimentos em atividades sem apego ou aversão, sem competição interna. As ações tornam-se as mesmas porém sem agitação, sem medo de perder nem desejo por vitória. Mas aí estamos falando de um treinamento muito superior, que alcança este resultado mesmo mergulhado em um trabalho. Neste momento todo trabalho é férias, todas as férias são indestinguíveis do trabalho."

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