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China, múltiplos caminhos
por Petrucio Chalegre, Diretor-Presidente

"Che Huang-ti foi o rei de Tsin, unificando a China aboliu o sistema feudal. Contemporâneo de Aníbal e suas conquistas construiu a Grande Muralha, tão imensa que devia ser escrita toda em maiúsculas. Mandou queimar todos os livros, queria que a história chinesa, que já tinha 3000 anos, começasse com ele. Fez chamar-se Primeiro Imperador, os que o sucedessem seriam chamados de Segundo, Terceiro etc...

A China dos tempos presentes não é diversa, em suas estranhezas, destes passados insólitos. A revolução cultural tentada por Mao, também tentou apagar os tempos pretéritos, queimando e destruindo a memória. A ação chinesa no Tibet incluiu dinamitar quase todos os templos e mosteiros budistas, não importando que fossem relíquias milenares, bibliotecas de sutras aqueceram as montanhas. Apagar uma cultura inteira é tarefa gigantesca e os chineses modernos continuam se sentindo como o Império do Centro, o mundo inteiro é periférico.

Chama a atenção esta determinação de tomar decisões drásticas. A China era comunista, sua privatização foi tão violenta que 80% da sua produção já é privada, o país estatal já foi praticamente desmontado, em 2001 mais cinco milhões de empregos públicos serão abolidos. Mas o crescimento privado é tão vigoroso que os demitidos serão absorvidos no mundo capitalista. E a China conseguiu entrar na OMC, comprometeu-se a ser ainda mais liberal em termos comerciais, globalizar-se, aquilo que todos criticam e que todos querem.

O Partido Comunista tenta manter-se indefinidamente no poder, diria melhor, os dirigentes comunistas agem como reformistas liberais em termos de comércio exterior e privatizações, enquanto lutam para manter o poder central nas mãos de sempre. Não se pejarão de revisar a história e derrubar as estátuas de Mao Tse-tung se isso for necessário para continuar no controle. Uma virada imprevista, uma onda que transforme radicalmente o país, não é uma impossibilidade, foi impedida uma vez com o massacre da Praça da Paz Celestial, mas as condições tornam-se cada vez mais propícias aos desafios à autoridade central. O amortecedor é o crescimento econômico, espera-se 7,5% em 2001, a renda per capita dobrou em seis anos, o PIB é de 1,2 trilhão, cinco vezes maior que o russo, quase duas vezes o do Brasil.

Che Huang Ti não conseguiu abolir o passado, nem ser o "Primeiro" para sempre. Porém sua obra permaneceu para o espanto do futuro. O porvir da China pode ser politicamente insondável, mas sua entrada cada vez mais forte no mercado mundial de alimentos poderá alterar os destinos de muitos agricultores, são 1,27 bilhão de bocas ansiosas. Nos próximos dois anos os preços do açúcar, trigo, sorgo, milho estarão em ascensão. Uma China cada vez mais capitalista precisará, cedo ou tarde, de democracia, os destinos do Império do Centro poderão ser difíceis de prever, mas continuarão a causar estarrecimento dada sua dimensão ciclópica como a da Grande Muralha."

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